domingo, 26 de outubro de 2008

Obesidade associada a Transtorno Alimentar

Das pessoas com obesidade que buscam tratamento, por volta de 30% são diagnosticadas com Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica. Na população em geral, a porcentagem está entre 2 a 5%.

O critério de diagnóstico para Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP) proposto pelo DSM-IV (manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais) é o seguinte:

a. Episódios recorrentes de compulsão alimentar. Um episódio de compulsão alimentar é caracterizado por ambos os seguintes critérios:
1. ingestão, em um período limitado de tempo (por exemplo, dentro de um período de duas horas), de uma quantidade de alimentos definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria em um período similar, sob circunstâncias similares;
2. um sentimento de falta de controle sobre o episódio (por exemplo, um sentimento de não conseguir parar ou controlar o que ou quanto se come).
b. Os episódios de compulsão alimentar estão associados a três (ou mais) dos seguintes critérios:
1. comer muito e mais rapidamente do que o normal;
2. comer até sentir-se incomodamente repleto;
3. comer grandes quantidades de alimentos, quando não está fisicamente faminto;
4. comer sozinho por embaraço devido à quantidade de alimentos que consome;
5. sentir repulsa por si mesmo, depressão ou demasiada culpa após comer excessivamente.
c. Acentuada angústia relativa à compulsão alimentar.
d. A compulsão alimentar ocorre, pelo menos, dois dias por semana, durante seis meses.
e. A compulsão alimentar não está associada ao uso regular de comportamentos compensatórios inadequados (por exemplo, purgação, jejuns e exercícios excessivos), nem ocorre durante o curso de anorexia nervosa ou bulimia nervosa.

Em relação a indivíduos obesos sem TCAP, aqueles que possuem tal diagnóstico geralmente apresentam:

- atitudes mais disfuncionais relacionadas à alimentação e ao peso, além de extrema preocupação e insatisfação com o peso e forma corporal.
- maiores níveis de impulsividade, ansiedade, isolamento social e maior vulnerabilidade à depressão. Pior qualidade de vida e pior auto-estima. Geralmente, sintomas associados melhoram com a melhora do problema alimentar.
- Pior resposta aos tratamentos para emagrecer (há estudos demonstrando que isso ocorre geralmente quando se considera um transtorno afetivo concomitante), maior número de tentativas mal sucedidas de adesão à dietas, maior dificuldade em perder peso, pior manutenção do peso perdido e maior taxa de abandono do tratamento.

sábado, 11 de outubro de 2008

Avaliação psicológica pré-cirúrgica dos candidatos à cirurgia bariátrica: considerações.

Muitos pacientes chegam cheios de resistência ao consultório do psicólogo: decididos a fazer a cirurgia da obesidade e encaminhados pelo cirurgião, temem qualquer impedimento que possa surgir durante a entrevista, qualquer veto. Dá para compreender. Essa não é, de jeito algum, uma decisão fácil. No mínimo a pessoa carrega, em incontáveis expectativas, emoções difíceis de elaborar. Para muitos, a gastroplastia é a luz no fim do túnel; é, finalmente, uma oportunidade de renascer.

A primeira coisa a ser considerada é a postura do psicólogo. Mais do que nunca se faz necessária a capacidade de compreender o paciente a partir de sua própria perspectiva, a aceitação, o acolhimento, a compreensão dos próprios preconceitos. Há trabalhos interessantíssimos sobre a determinância que tem tal postura do profissional no sucesso do tratamento de obesos, seja daqueles que vêm em busca de acompanhamento clínico para emagrecer ou daqueles que são caso de cirurgia.

A história do paciente é investigada, contada por ele. Em particular, as questões relacionadas ao peso, às tentativas anteriores de emagrecimento, a relação com seu corpo, com os outros, enfim... Falamos aqui de um levantamento de dados e, muito além disso, de um processo narrativo que ajuda a ressignificar, integrar, relacionar...

Cabe dizer que não é incomum haver um desejo tão grande de emagrecer que a questão da saúde acaba ficando, digamos assim, em segundo plano. Para o paciente parece ser óbvio que ele terá atenção com sua saúde após a cirurgia. Mas não é tão óbvio assim. Umas das expectativas que pacientes relatam é, por incrível que possa parecer, "a de não ter mais que se preocupar com o que comer, com dieta". Fazem a cirurgia, começam a emagrecer, deixam o cuidado com a alimentação saudável "para mais tarde". Afinal, prestar tanta atenção no que deve, no que não deve comer, tornou-se por demais aversivo durante tantas tentativas anteriores fracassadas. Ao se ver emagrecendo, foca-se em "curtir" a novidade.

É sabido que a cirurgia bariátrica afeta o paciente de diversas formas. Ele precisa:

  • ser capaz de lidar com as restrições iniciais na dieta,
  • acostumar-se a novos hábitos alimentares que deverão ser incorporados de forma definitiva,
  • lidar com novas sensações e experiências corporais,
  • adequar-se à mudança de sua imagem corporal,
  • adquirir novos comportamentos de cuidado de si,
  • lidar com novas cognições e sentimentos,
  • adequar-se a um diferente estilo de vida,
  • lidar com mudanças inesperadas e significativas nos relacionamentos pessoais que costumam ocorrer com certa freqüência após emagrecimento importante.
Como o paciente lidará com tudo isso? Tem ele recursos psicológicos para dar conta de tantas mudanças?

Basicamente, na avaliação pré-cirúrgica, o papel do psicólogo será o de identificar os fatores de risco psicossociais vinculados à realização da cirurgia, como a presença de alguma psicopatologia ou de atitudes e comportamentos que sabidamente complicariam o ajustamento pós-operatório. A partir de tal avaliação, vai fazer recomendações ao paciente e à equipe visando alcançar os melhores resultados possíveis com o procedimento, a curto, médio e a longo prazo. O psicólogo vai também auxiliar o paciente quanto à compreensão de todos os aspectos decorrentes do pré e do pós-cirúrgico; vai ajudá-lo a tomar decisões mais conscientes e de acordo com seu caso particular.

O psicólogo irá avaliar, na entrevista com o paciente:

  • o senso de identidade,
  • a estabilidade emocional/humor,
  • a habilidade para compreender o risco da cirurgia e para dar seu consentimento de forma responsável,
  • as estratégias comportamentais que possui em seu repertório para lidar com situações diversas e difíceis,
  • a disposição a aceitar o suporte necessário,
  • a resiliência, ou seja, sua capacidade (psicológica) de suportar o trauma cirúrgico e de lidar de forma positiva com os diversos estressores e ajustamentos associados às mudanças de estilo de vida após a cirurgia,
  • a motivação e
  • o compromisso de seguir com os cuidados de longo termo, aprender novas habilidades e aderir a um programa de estilo de vida saudável, que inclui tomar decisões acertadas em relação ao cuidado de si e à necessidade de colocar limites.
Ou seja, avaliação psicológica implica abordagem multifacetada, isto é, a abordagem da questão nas perspectivas comportamental, cognitiva e emocional, de desenvolvimento, da situação atual de vida, da motivação e das expectativas.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

"Não se engesse!"


Posto aqui dois trechinhos de um post que li num blog de nome super-criativo:

"Mini Size Us - Emagrecendo Juntos". (http://minisizeus.com/). O blog é do casal Jana e Fábio.

Adorei!

Nesse post, Jana escreve sobre auto-estima e emagrecimento:

“Eu acredito que a auto-estima deve ser trabalhada todos os dias e que aos poucos aprendemos a nos conhecer melhor e a entender nossos pontos fortes, sem nos esquecermos que podemos trabalhar os pontos mais fracos também, em vez de nos acostumarmos a eles. O que é mais viável? Esperar ou começar agora a viver?”

(...)

“Não podemos esquecer que aprimorar-se é um processo e é contínuo. Só deixaremos de nos movimentar, de aprender, de nos relacionar com o outro ao deixarmos este mundo, mas até lá temos muito a trazer para nossa vida e nunca devemos perder a noção de que não somos seres prontos. Estamos em constante transformação.”

Ou seja, frente à multiplicidade de quem somos, é estar "engessado" depender de apenas um fator (a aparência, no caso), para gostarmos de nós mesmos e acharmos que temos valor. Fator central mantenedor dos transtornos alimentares, inclusive, é a avaliação de si quase que exclusivamente baseada na aparência, na forma e no peso do corpo.

Falei hoje mesmo com uma paciente que podíamos usar a metáfora do condicionamento físico para as questões psicológicas, também. Ou seja: quem está muito sedentário fisicamente, cansa-se muito facilmente com qualquer esforço. O que fazer? Começar a caminhar, a se mexer, pouco a pouco, de forma constante. Até que “se ganha em condicionamento físico”, e o cansaço é combatido.

Gostar da gente mesmo também depende de uma construção, de um esforço, de insistência em tentar acertar, em uma busca constante. O cansaço emocional e o desânimo podem, tal qual “a falta de condicionamento físico”, ser “combatidos” com AÇÕES e maior flexibilidade no pensamento. Precisamos, portanto, começar a "caminhar", e não esperar o momento propício ou ideal para tomar uma atitude.